Presos médico e advogado envolvidos na emissão de falsos laudos para cultivo de maconha no Rio

O biólogo André Vicente Souza de Freitas, preso na terça-feira em uma operação da 14ª DP (Leblon), tinha a autorização da Justiça para uso medicinal próprio de cannabis. Ele é investigado por associação para o tráfico, extorsão e falsidade ideológica. Segundo a Polícia Civil, Freitas participava de um esquema de venda de laudos falsos para pessoas que queriam cultivar a droga em casa também conseguirem autorização. No processo em que conseguiu o aval para produzir maconha em casa, o biólogo alegou ter dores crônicas “não lhe permitem movimentos temporariamente”.

O parecer médico foi anexado ao processo em 2020 e a decisão autorizando o cultivo, três anos depois. Em suas redes, Freitas gostava de postar fotos fazendo posições de ioga e até em cima da Pedra do Telégrafo, que só é acessada por trilha. Nas imagens, aparece até mesmo de cabeça para baixo.

Imagem na Pedra do Telégrafo foi postada nas redes sociais de André — Foto: Reprodução

Imagem na Pedra do Telégrafo foi postada nas redes sociais de André — Foto: Reprodução

Operação Seeds

Quatro pessoas envolvidas num esquema para emissão de falsos laudos para cultivo de maconha foram presas na manhã desta terça-feira. A Operação Seeds é deflagrada pela 14ª DP (Leblon). O advogado Patrick Rosa Barreto, o biólogo André Vicente Souza de Freitas e o médico Adolfo Antônio Pires foram detidos. Pérola Katarine de Castro, esposa de Adolfo e responsável pela parte financeira, também foi presa. Segundo as investigações, a quadrilha produzia pareceres indicando que “pacientes” precisariam desse uso medicinal da planta, mas o objetivo era vender a droga para lucrar — e não havia qualquer enfermidade nos “clientes”.

Segundo a investigação, a quadrilha oferecia um pacote para a plantação de skunk, que tem efeito mais potente que a maconha tradicional. Entre os serviços oferecidos pelo grupo, estão a emissão de laudo e entrada com habeas corpus, além da estrutura para plantar as mudas. Para isso, eram cobrados de R$ 3 mil a R$ 50 mil dos compradores. Caso alguma das partes acordadas não fosse paga, começava a extorsão.

O biólogo André Vicente Souza de Freitas ao ser preso na operação Seeds — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

O biólogo André Vicente Souza de Freitas ao ser preso na operação Seeds — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

Pela Lei Antidrogas, é proibido plantar maconha em casa, mas se pode conseguir judicialmente autorização para produção e consumo de cannabis para fins terapêuticos. Nenhum dos casos investigados se relacionava a enfermidades que indicassem o uso.

Além da plantação caseira, o grupo comercializava frascos com diluição de extratos da planta em altas concentrações. O produto, que era enviado para todo o país, continha concentrações, por exemplo, de 80 a 100% de canabidiol, também conhecido como CBD, além de valores entre 10 e 20% de THC, substância responsável pelos efeitos psicoativos e neurotóxicos. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) impõe restrição na fórmula, que só pode ter 0,2% de THC.

Todos os envolvidos no esquema responderão por extorsão, associação ao tráfico de drogas e falsidade ideológica.

Polícia apreende material usado para a produção de óleos vendidos de forma ilegal  — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo

Polícia apreende material usado para a produção de óleos vendidos de forma ilegal — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo

‘Varejo’ de habeas corpus

O esquema foi apontado pela advogada que representa dois homens presos após envolvimento com a quadrilha. Segundo ela, alegando serem portadores de enfermidades, os pacientes entraram com um habeas corpus na Justiça solicitando a autorização para o cultivo caseiro e extração da substância canabidiol. Para isso, apresentavam um laudo médico falso e alegavam o alto custo do tratamento.

Em alguns casos, obtinham a permissão. Apenas no estado do Rio, segundo a polícia, o grupo entrou com 13 habeas corpus na Justiça. A quadrilha, porém, também comercializava para outros estados do país.

Uso no tratamento de esquizofrenia e contra efeitos da quimioterapia

A maconha medicinal vem sendo usada como aliada no tratamento de doenças e condições que vão da esquizofrenia à insônia, passando pela dor crônica e pela náusea provocada pela quimioterapia. Seu mercado global já vale US$ 16,5 bilhões, segundo cálculo da Market Data Forecast, que prevê um crescimento de 23% ao ano até 2027, atingindo mais de US$ 46 bilhões.

Segundo a coluna Capital, um levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Canabinoides (BRCann) realizado com dados da auditora IQVIA calcula que a venda de cannabis medicinal em farmácias brasileira quadruplicou no ano passado, para 155,8 mil unidades. A Ease Labs, por sua vez, cita projeção da Kaya Mind segundo a qual o setor deve movimentar R$ 655 milhões este ano.

Skunk, uma planta híbrida e mais potente que a maconha tradicional, foi apreendida na ação — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo

Skunk, uma planta híbrida e mais potente que a maconha tradicional, foi apreendida na ação — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo

Preso em ação por golpes de precatórios

Patrick Rosa Barreto, preso preventivamente nesta manhã, foi detido em flagrante em 4 de abril deste ano, numa operação também da 14ª DP (Leblon). A ação, denominada Poseidon, visava a um esquema que desviava precatórios judiciais com documentos falsos. Na ocasião, porém, foram encontrados 73 gramas de maconha, além de uma balança e sacos usados para o preparo da carga de droga.

Patrick, então, foi preso por tráfico de drogas. Ele também responde por falsificação de documento público e particular, estelionato contra idoso e associação criminosa. O advogado teve liberdade provisória decretada dois dias depois, após audiência de custódia.

 

 

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