Comissão de Direitos Humanos discute estratégias para redução de acidentes de trânsito
Tema foi debatido durante audiência pública: avenidas Brasil, das Américas e Lúcio Costa, além da Linha Vermelha, concentram a maior parte das ocorrências
Dados da prefeitura do Rio mostram que, em 2024, foram registradas 723 vítimas fatais no trânsito, o que equivale a dois óbitos por dia. O panorama é alarmante e foi apresentado pelos participantes da audiência pública promovida pela Comissão Permanente de Defesa dos Direitos Humanos da Câmara do Rio na tarde desta sexta-feira (30/05). O evento marcou o encerramento do Maio Amarelo e reuniu representantes do Poder Executivo, do Corpo de Bombeiros, do Observatório Nacional de Segurança Viária e da sociedade civil.
Presidente do colegiado, o vereador Marcos Dias (Podemos) destacou que a campanha deve servir de alerta para todos e provocar ações concretas do poder público. O parlamentar enfatizou que as mortes no trânsito são evitáveis.
“A realidade do Rio de Janeiro exige mais do que campanha, exige ação. Dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro revelam que, em 2024, a cidade do Rio registrou 12.071 acidentes de trânsito, um aumento de 20% em relação ao ano anterior. Os acidentes com morte também cresceram de forma alarmante. Entre as vítimas, a maioria é de jovens, motociclistas, entregadores e pedestres”, acrescentou.
Representante da Secretaria Municipal de Saúde, Gislane Mateus ressaltou que o Plano de Segurança Viária da cidade tem como objetivo reduzir em pelo menos 50% o número de óbitos e lesões no trânsito até 2030, uma meta internacional. No entanto, o quadro do primeiro trimestre de 2025 não trouxe bons resultados. Foi registrado um aumento de 17% em relação aos acidentes e lesões e 43% em relação aos óbitos.
“O ano de 2024 teve o maior número de mortes no trânsito desde 2008, com 723 óbitos. Isso significa que a cada dia duas pessoas morrem no trânsito da cidade do Rio de Janeiro. É um número que excede até óbitos por outras doenças, dada a complexidade desse problema. Quando a gente olha as pessoas que não morreram, também estamos em uma crescente. Tivemos uma redução durante o período da pandemia, em 2020 e 2021, por causa do isolamento e da diminuição da circulação, mas depois passamos a ter uma crescente. Em 2024, foram 12.900 acidentes na cidade”, apontou a superintendente de Vigilância em Saúde.
Acidentes com motocicletas
A prefeitura trouxe dados sobre os atendimentos realizados na rede de emergência da cidade. No ano passado, 69% dos atendimentos de sinistros envolveram motocicletas, 15% pedestres, 11% bicicletas e 5% automóveis ou caminhões. Tendo em vista este cenário, o vereador Marcos Dias indagou ao Poder Executivo sobre a realização de campanhas de capacitação e treinamento voltadas para os motociclistas que atuam em aplicativos de entrega e de serviço.
O presidente da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio), Luiz Eduardo Oliveira da Silva, disse que a prefeitura já deu um primeiro passo ao assinar um acordo de cooperação técnica com as plataformas.
“Essa ação vai nos permitir enxergar quem são esses entregadores, como esses aplicativos estão trabalhando nessas iniciativas de capacitação. Se eventualmente o entregador pegou uma contra mão ou avançou um sinal, a gente vai começar a ter esse conhecimento. Já existe tecnologia para isso, nós usamos quando solicitamos algum desses serviços de aplicativo”, explicou.
Integração de dados
O major bombeiro Flávio Contreiras, porta-voz da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, afirmou que o Rio é o município com o maior número de ocorrências em todo o estado. Mas chamou a atenção para o fato de que os dados da prefeitura e do estado não são integrados atualmente e que isso é fundamental para a formulação de políticas públicas.
“Nós temos dados que não são idênticos aos apresentados na audiência porque em alguns casos os bombeiros são acionados e em outros, não. Por isso, devemos buscar a integração dos bancos de dados, para cruzar as informações. Ano passado, foram registradas 184 mortes por mês no estado. Também mapeamos as ruas, estradas e vias com mais ocorrências no estado. Das cinco com mais registros, quatro ficam na cidade do Rio: Avenida Brasil, Avenida das Américas, Linha Vermelha e Avenida Lúcio Costa”, informou.
Mais ações educativas
Todos os participantes da audiência pública refletiram sobre a importância das ações educativas como forma de prevenção. Integrante da ONG Observatório Nacional de Segurança Viária, Maicon de Paula reforçou que o tema deve ser trabalhado o mês inteiro.
“O Observatório tem um eixo chamado Observatório Educa. Nós temos uma coleção para subsidiar as prefeituras e os governos estaduais. Possuímos uma gama de materiais de estudo, referências e artigos para subsidiar o pilar de pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica. O Observatório também se coloca à disposição para consultas, parcerias e acordos de cooperação técnica”, destacou.
Vogal interino da Comissão, o vereador Flávio Pato (PSD) adiantou que criou uma proposta com o intuito de promover mais ações educativas pela cidade ao longo do ano. “Nós apresentamos um projeto de lei chamado ‘Rio por um trânsito mais seguro’, que cria uma plataforma na qual qualquer cidadão poderá enviar denúncias contendo fotos ou vídeos de condutas imprudentes no trânsito aos órgãos competentes. O objetivo não é punir diretamente, mas utilizar o material coletado para fins educativos e planejar ações específicas para os locais com maiores índices de infrações”, contou o parlamentar.
Gerente do SAMU-Rio, Luiz Thiengo reiterou a importância de normas para promover a educação no trânsito. “É muito importante essa discussão porque a partir de uma lei de 2008, a Lei Seca, já conseguimos diminuir o número de muitos incidentes, principalmente de trânsito.”
Vice-Presidente da Comissão, o vereador Rafael Satiê (PL) participou de maneira virtual.
Depoimentos de vítimas
Durante a audiência, cidadãos subiram na tribuna para relatarem suas preocupações e casos ocorridos com familiares. Marcelo Rosa, militante de questões sociais e membro da área de coordenação na Secretaria de Integração Metropolitana, se emocionou ao contar o acidente que fez sua filha mais velha quase perder uma das pernas. Ela pediu uma moto por aplicativo para ir até o trabalho, mas acabou sendo atropelada por um carro que avançou o sinal. O motociclista morreu na hora, a sua filha perdeu a capacidade de dobrar o joelho e passará por uma cirurgia.
“O Maio Amarelo deveria ser o ano inteiro para que mais políticas públicas sejam efetivadas nessa área porque a gente nunca pensa que vai acontecer com a gente, mas eu estou há quase um ano sofrendo na cadeira do hospital”, lamentou Marcelo.
Vivi Zampieri é gestora da Comissão de Segurança no Ciclismo no município e trouxe preocupações relacionadas à regulamentação dos ciclomotores. “Em março de 2023, a nossa comissão protocolou urgentemente para a Prefeitura a redução da velocidade nas orlas da cidade, um pedido pautado em dados e estudos. Se esse pedido tivesse sido ouvido, dois sinistros de trânsito graves poderiam ter sido evitados, um deles resultou em uma morte e o outro em lesões sérias.”
“Obtivemos dados através da Lei de Acesso à Informação que mostram um aumento de 702% nos sinistros com ciclomotores e veículos autopropelidos na cidade do Rio. Para obtermos esses dados, nós tivemos que triangular com vários órgãos que prestam socorro, pois nenhum deles traz a opção ‘ciclomotores’ em seus boletins de atendimento às vítimas, apesar de a nossa comissão já ter feito essa solicitação ao plano de segurança viária da cidade, em 2023”, completou Zampieri.