Entenda a sucessão de falhas das forças de segurança que possibilitou os atos terroristas em Brasília

Os ataques às sedes dos três Poderes da República neste domingo expuseram um conjunto de falhas das forças de segurança. Elas vão desde a falta de planejamento para se precaver de uma investida anunciada a indícios de omissão por parte do governador Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), afastado do cargo por ordem de Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro da Justiça, Flávio Dino, classificou o episódio de “capitólio brasileiro” e avaliou que uma mudança promovida pelo governo do DF no esquema de segurança planejado reduziu o número de policiais militares mobilizados e facilitou o acesso do golpistas à Praça dos Três Poderes. O próprio Dino e o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, porém, também cometeram erros que contribuíram para o desfecho, na avaliação inclusive de petistas.

Dino declarou ontem que, inicialmente, estava prevista a instalação de barreiras na Esplanada dos Ministérios para impedir o acesso à Praça dos Três Poderes. De acordo com ele, de última hora, o governo do DF decidiu liberar a passagem dos golpistas até as proximidades do Congresso. Apenas o fluxo de veículos foi interrompido.

— Isso ensejou para que essas pessoas descessem a Esplanada e, em seguida, houve o descontrole — afirmou Dino.

O EXTRA presenciou a chegada de bolsonaristas radicais ao gramado em frente ao Congresso. Um contingente pequeno de policiais estava posicionado local e não foi capaz de impedir a multidão de invadir e depredar as dependências da Câmara e do Senado. O roteiro se repetiu no Palácio do Planalto e no STF.

Outra ocorrência indica que houve negligência das autoridades na capital federal. Na manhã de domingo, horas antes dos ataques, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) emitiu um alerta à secretaria de Segurança do DF, entre outros órgãos, de que bolsonaristas radicais planejavam promover atos violentos. Os agentes identificaram que golpistas acampados em frente ao QG do Exército em Brasília estavam fazendo convocações para uma invasão ao Congresso.

Um relato do presidente do Senado em exercício, Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), reforça as mesmas suspeitas. Ele afirmou ter sido procurado, na manhã de domingo, por integrantes da Polícia Legislativa preocupados com o deslocamento de manifestantes à Esplanada. O senador disse que entrou em contato com o secretário da Casa Civil do Distrito Federal, Gustavo Rocha, que o tranquilizou:

— Recebi a informação de que não deveríamos nos preocupar, porque a situação estava plenamente sob controle.

O EXTRA procurou Rocha para comentar a afirmação, mas ele não retornou os contatos. A secretaria de Segurança do DF também não se manifestou sobre as acusações feitas por Dino.

No despacho em que determinou o afastamento de Ibaneis, publicado nas primeiras horas de segunda-feira, o ministro do STF Alexandre de Moraes foi categórico ao afirmar que houve “participação efetiva” de autoridades de segurança e inteligência no episódio que culminou na destruição do patrimônio público. “A omissão e conivência de diversas autoridades da área de segurança e inteligência ficaram demonstradas com a ausência do necessário policiamento, em especial do Comando de Choque da Polícia Militar do Distrito Federal”, escreveu.

Os ataques golpistas deram origem a outras frentes de apuração. O Ministério Público Federal no DF instaurou um procedimento para investigar as suspeitas de omissão do comando da PM e de crimes contra o Estado democrático. Os investigadores requisitaram dados sobre o efetivo policial empregado e as orientações transmitidas à tropa, para verificar se há indícios de irregularidades.

Embora o ônus político tenha recaído majoritariamente sobre Ibaneis Rocha, lideranças petistas com trânsito no Planalto avaliam que tanto o ministro da Defesa, José Múcio, quanto Flávio Dino saíram com as imagens chamuscadas pelo ataques terroristas. Múcio classificou os acampamentos bolsonaristas, de onde partiram as investidas, como “manifestações democráticas”. Em outra ocasião, sustentou que os atos estavam perdendo força.

Sobre Dino há desconfiança de que ele falhou ao confiar na palavra e no plano de segurança de Ibaneis, um dos governadores que tinham boas relações com Bolsonaro. Além disso, na entrevista de ontem, o ministro da Justiça admitiu que só havia 140 agentes da Força Nacional disponíveis para complementar o esquema de segurança. O restante do contingente, cerca de 500 homens, estava em missões em outros estados.

Vídeos comprometedores

Imagens que circularam em redes sociais mostram cenas reveladoras d a atuação das forças de segurança. Diferentes vídeos exibem policiais militares imóveis diante do avanço dos golpistas, inclusive na entrada do Congresso Nacional. Outros revelam PMs discutindo dentro do Planalto sobre prender ou não terroristas.

Questionado pelo EXTRA, a secretaria de segurança da capital não informou a quantidade de policiais que atuaram no domingo. O Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsáveis pelo Planalto, também não informaram o contingente disponível no domingo. O STF disse apenas que destacou todos os seus agentes para trabalhar no domingo, mas sem esclarecer quantos eram. Já a Polícia Legislativa do Senado informou que empregou a totalidade do seu efetivo, de 60 homens, enquanto a polícia da Câmara disse que tinha cem agentes no local.

O presidente do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Cássio Thyon, avalia que as forças de segurança subestimaram a capacidade dos extremistas.

— Quando um evento desse dá errado, há falha. Como as forças de segurança agiram nos acampamentos de uma forma menos repressora do que deviam, provocou no imaginário dos manifestantes a ilusão de que eles teriam apoio dos militares — afirmou.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *