‘Vê-la daquele jeito foi devastador’: lesões em menina de 2 anos estuprada e morta expõem violência que teria sido cometida por mãe e padrasto

Em relato emocionado sete dias após o assassinato da enteada Sophia de Jesus Ocampo, de apenas 2 anos, o recepcionista Igor de Andrade falou sobre a dificuldade em esquecer o momento em que viu a menina sem vida. Ao GLOBO, ele disse que a vítima estava com marcas de soco e lesões na região do tórax e da cervical, com nariz e boca sangrando, além de estar com os braços, rosto e olhos com hematomas. Sem ter tido a chance de conseguir a guarda da enteada junto ao companheiro e pai da vítima, Jean Carlos Ocampo, após formalizarem duas denúncias de maus tratos contra a genitora, Igor diz que, hoje, fica com a saudade de ouvir Sophia o chamando de “papai urso”. Jean ainda não está em condições psicológicas de falar sobre o caso.

— Ver a nossa menininha daquele jeito foi devastador. Ela é minha filha do coração, tenho vídeos dela dizendo que tinha dois pais e que eu era o papai urso. O que mais dói é saber que toda a burocracia de testemunhas tirou a nossa filha da gente. As pessoas desistiam de depor. Todas as denúncias foram em vão e agora estamos lutando para que não existam outras vítimas como a Sophia — afirma Igor, que tem mobilizado as redes sociais com a hashtag #JustiçaPorSophia.

Sophia morreu na última quinta-feira (26), na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Coronel Antonino, no Centro de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, após ser agredida e estuprada. A mãe e o padrasto da criança, de 24 e 25 anos respectivamente, foram presos e autuados homicídio qualificado por motivo fútil e estupro de vulnerável. No prontuário médico da vítima consta que ela já havia sido atendida 30 vezes na UPA, uma delas por fraturar a tíbia.

De acordo com Igor e Jean Carlos, era comum a enteada chegar na casa deles com hematomas pelo corpo. Em dezembro, um boletim de ocorrência foi registrado contra a mãe da criança, identificada como Stephanie de Jesus da Silva, por maus tratos.

— Na primeira vez que denunciamos a genitora, porque me recuso a falar que ela é mãe, nossa pequena tinha chegado em casa com a perna toda roxa, com arranhões no rosto e no corpo. Tinha marcas de dedos, como se tivesse apanhado mesmo. Fomos até o Conselho Tutelar, que nos orientou a fazer um boletim de ocorrência, mas não deu resultado. O que propiciou as sucessivas agressões — afirma o padrasto.

O segundo B.O. foi formalizado em novembro do ano passado, quando a criança chegou na casa do pai com a perna quebrada. Questionada pelo responsável, Stephanie teria dito que a menina caiu no banheiro. Igor relata que a mulher não respeitava as regras da guarda compartilhada e impedia a menina de ver o pai.

Denúncia enviada ao MP

A primeira denúncia foi arquivada pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul. O MP informou que foi registrado, em janeiro de 2022, um Termo Circunstanciado de Ocorrência por maus-tratos, na 10ª Vara do Juizado Especial Central.

Na época, foram ouvidas pela Polícia Civil a avó e a mãe da criança, que negaram ter os maus-tratos com a criança. Segundo o MP, o pai compareceu na audiência preliminar e informou perante a autoridade policial que os maus-tratos não voltaram a acontecer.

Sobre o segundo B.O., o MP confirmou que foi registrado junto à 11ª Vara do Juizado Especial, mas não foi repassado ao órgão.

Menina chegou morta no hospital

De acordo com a Polícia Civil, a mãe levou a menina à unidade de saúde, onde ela já chegou morta. Os médicos constataram que o óbito havia ocorrido cerca de quatro horas antes. No corpo da vítima havia vários hematomas e indícios de violência sexual.

A médica que atendeu a criança contou aos policiais que a mãe informou ter encontrado a filha desacordada. De acordo com a profissional, Stephanie estava “bem tranquila e mesmo após de ser avisada do falecimento da filha, ela continuou tranquila e só apresentou nervosismo quando foi informada de que seria necessário acionar a polícia para ir até o local.”

Contrariando o depoimento da profissional de saúde que atendeu a criança, mãe e padrasto afirmaram que a menina chegou com vida na UPA. Quando questionados sobre as agressões, por conta dos hematomas encontrados no corpo de Sophia, confessaram que agrediram a menina, cerca de três dias antes da morte, com tapas nas costas.

Segundo a polícia, os suspeitos já tinham combinado toda a história que iriam falar a respeito dos hematomas da criança. A mãe da vítima informou que o padrasto dava tapas e socos na menina e que ela já estava desconfiando dos abusos sexuais.

Mais tarde, a mãe mudou sua versão e afirmou que o padrasto costumava agredir a menina com tapas e socos e já desconfiava dos abusos sexuais. O caso foi registrado na delegacia de plantão e será investigado pela Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA).

Menina chorava para dormir

De acordo com Igor, todas as vezes que Sophia ia para casa dele e de Jean os dois olhavam o corpo da filha, a fim de saber se havia marcas de agressão. Em uma das vezes, ele viu que a vagina da menina estava muito vermelha e o ânus estava com uma fissura, expelindo secreção. A informação foi confirmada pela polícia, em exame de corpo de delito realizado após a morte da vítima.

Na hora de dormir, o recepcionista disse que a criança chorava falando que o pai batia e brigava com ela.

— A gente perguntou à genitora sobre a situação da região íntima da Sophia, mas ela respondeu que ela só estava muito ressecada — relata.

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