Uma dose de vacina é capaz de prevenir HPV por pelo menos três anos, mostra estudo

Uma única dose da vacina contra o papilomavírus humano é altamente eficaz para evitar infecções durante três anos, provavelmente reduzindo as taxas de câncer do colo do útero, também conhecido como câncer cervical, e outras doenças ligadas ao vírus, de acordo com um novo estudo realizado no Quênia (leste da África).

Uma estratégia de dose única ampliaria drasticamente a oferta da vacina, reduziria os custos e simplificaria a distribuição, tornando a vacinação uma opção mais viável em países com recursos limitados, disseram especialistas.

HPV é uma infecção sexualmente transmissível ligada ao câncer do colo do útero e a outras doenças. As autoridades de saúde de muitos países, incluindo os Estados Unidos, recomendam duas doses da vacina para meninas adolescentes com menos de 15 anos e três doses para as mais velhas. [No Brasil, a vacina é oferecida no SUS para meninas e meninos de 9 a 14 anos, com esquema de duas doses, além de grupos como pacientes oncológicos e pessoas com HIV].

Mas os dados observacionais há muito sugerem que uma única dose oferece proteção eficaz contra o HPV durante pelo menos uma década. Os novos resultados são a primeira confirmação de um ensaio clínico padrão-ouro de que uma única dose pode ser tão eficaz quanto duas ou três, pelo menos por três anos.

Cerca de 24 países, incluindo México, Tonga e Guiana, adotaram a abordagem de dose única, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde). A nova evidência pode convencer mais países a adotar essa estratégia.

“O que havíamos previsto era que ela seria mais interessante para os países de baixa ou média renda”, disse Paul Bloem, consultor sênior de programas de vacinação contra o HPV na OMS. Mas países de alta renda como Grã-Bretanha e Austrália foram os primeiros a mudar suas políticas, observou ele.

A OMS estima que, se for implementada amplamente, a estratégia de dose única poderia prevenir 60 milhões de casos de câncer do colo do útero e 45 milhões de mortes em todo o mundo nos próximos cem anos.

O câncer do colo do útero é o quarto tipo de câncer mais comum em mulheres em todo o mundo, com uma estimativa de 604 mil novos casos em 2020, segundo a OMS. A doença matou cerca de 342 mil mulheres em 2020, superando o número de mortas durante a gravidez ou o parto.

“É um verdadeiro assassino de mulheres”, disse o doutor Seth Berkley, CEO da Gavi, organização que financia programas de imunização em países de baixa renda. “Também é uma doença que realmente mata mulheres no apogeu de suas vidas”, acrescentou, “e o faz de uma maneira realmente horrível.”

Mais de 95% dos casos de câncer do colo do útero são causados pelo HPV sexualmente transmissível. Diversas cepas do vírus são predominantes, mas os subtipos 16 e 18 são responsáveis por 70% desses casos.

A vacina contra o HPV estreou em 2006 e é uma “intervenção preventiva quase perfeita para o câncer do colo do útero e outros cânceres associados ao HPV”, disse a doutora Ruanne Barnabas, chefe da divisão de doenças infecciosas do Hospital Geral de Massachusetts (EUA), que liderou o novo estudo.

A Administração de Alimentos e Drogas dos Estados Unidos aprovou a vacina naquele ano, e, desde então, as infecções com as cepas virais que causam câncer caíram mais de 80% no país, segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças.

É um verdadeiro assassino de mulheres. Também é uma doença que realmente mata mulheres no apogeu de suas vidas, e o faz de uma maneira realmente horrível

Seth Berkley, CEO da Gavi, organização que financia programas de imunização em países de baixa renda

Ainda assim, cerca de 13 mil americanas são diagnosticadas com câncer do colo do útero a cada ano; cerca de 4.000 mulheres morrem da doença anualmente.

O número de vítimas do HPV é muito maior em países de baixa e média renda, onde as mulheres têm acesso limitado a exames de rastreamento ou tratamentos. Aproximadamente 90% das mortes pela doença em 2020 ocorreram entre mulheres que viviam em países com poucos recursos.

No Quênia, a vacina é atualmente administrada em duas doses. Mas apenas 33% das meninas de 9 a 14 anos recebem a primeira dose e somente 16% retornam para a segunda. Em comparação, mais de 78% das adolescentes nos Estados Unidos receberam pelo menos uma dose da vacina em 2021.

Um regime de vacinação de dose única é muito mais fácil de implementar em larga escala e permite mais canais de distribuição, como campanhas comunitárias e clínicas móveis.

“Isso permite uma oportunidade para a criatividade do mecanismo de entrega”, disse o doutor Peter Dull, que lidera o desenvolvimento da vacina contra o HPV na Fundação Bill & Melinda Gates, que financiou o estudo.

No estudo KEN SHE, pesquisadores designaram aleatoriamente 2.275 mulheres quenianas com idades entre 15 e 20 anos para receber uma dose única da vacina contra o HPV direcionada aos subtipos 16 e 18; uma vacina contra o HPV 16, 18 e sete outros subtipos; ou a vacina meningocócica, como controle.

Os cientistas coletaram esfregaços cervicais e vaginais das mulheres a cada seis meses e procuraram por infecção persistente por HPV durante até 36 meses.

A vacina teve uma eficácia de 98% contra os subtipos de vírus 16 e 18 ao longo de três anos e 96% contra todas as cepas causadoras de câncer, segundo o estudo. Nenhum efeito colateral grave foi relatado.

Resultados anteriores do estudo, publicados no ano passado, mostraram que uma única dose de ambas as vacinas foi altamente eficaz por 18 meses.

Em parte com base nessas evidências, no ano passado a OMS mudou sua recomendação para uma ou duas doses para meninas e mulheres jovens de 9 a 20 anos e duas doses com intervalo de seis meses para mulheres com mais de 21 anos.

Os programas financiados pela Gavi atingiram até agora apenas cerca de um terço de sua meta, em parte devido à escassez de vacinas. Cerca de 20 milhões de doses estiveram disponíveis em 2022, disse Berkley, mas esse número deverá mais que triplicar até 2025.

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