Novo MEC encontra mais da metade das construções de escolas e creches com prazo de entrega vencido

A cidade de Corumbá de Goiás, município de 11 mil habitantes a 131 km de Brasília, não tem nenhuma creche pública funcionando. O prédio que, que já deveria ter sido concluído, abrigaria as crianças já consumiu mais de R$ 700 milhões de dinheiro federal, mas nunca foi concluído.

Espalhado pelo Brasil, o problema foi recorrente na última década. Dos 7,2 mil convênios abertos pelo Ministério da Educação (MEC) com estados e municípios para a construção de creches, escolas e quadras esportivas, entre 2008 e 2022, quatro mil já deveriam ter sido entregues e não foram, segundo o Sistema Integrado de Monitoramento, Execução e Controle, do MEC. Em sua posse, o novo ministro da pasta, Camilo Santana, disse que entregar esses imóveis prontos é prioridade da gestão.

Por esses convênios, o MEC, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), repassa recursos a estados e municípios, que têm a obrigação de realizar as obras. Dessas construções atrasadas, 1.173 — cerca de 15% do total — já deveriam ter sido entregues há pelo menos cinco anos.

— O presidente quer em breve anunciar a retomada das obras inacabadas. Estamos com a equipe técnica avaliando as que estão paradas há muito anos e que precisarão de reajustes. Até o dia 27, ele quer anunciar ações desse tipo — afirmou Santana, em entrevista coletiva na última semana.

A promessa reacende a esperança de milhares de comunidades escolares pelo Brasil. Em Corumbá de Goiás, são duas obras paradas. Além da creche, também há um futuro colégio estadual de ensino médio em tempo integral, cujas obras já consumiram R$ 1,7 milhão e estão paradas desde 2015. A previsão é que ela tenha salas como laboratórios, biblioteca, auditório, quadra e espaços de convivência. Enquanto isso não acontece, os alunos que seriam beneficiados estudam num prédio sem quadra, que está em construção, e que teve o pátio transformado em refeitório.

— Na cidade, existe uma creche sob a tutela da Igreja Católica que presta serviços de forma filantrópica e atende parcialmente a população. Mas tem muitas mães que não podem trabalhar porque têm que cuidar das suas crianças — contou uma moradora da cidade, que pediu para não ser identificada.

Responsável pelo colégio de ensino médio, o governo de Goiás informou que retomou as obras em 2022 e ainda vai atualizar o sistema do MEC a respeito da volta dos trabalhos.

Do total de convênios, 832 ainda não tiveram as obras iniciadas. Ou seja, estão ainda em fase de planejamento ou licitação. Além dessas, há 1.338 em execução, 2.501 inacabadas (quando o convênio expira sem a entrega do imóvel) e 916 paralisadas (neste caso, o convênio está em vigor mas não há trabalho sendo feito). Ao todo, essas obras custariam R$ 7,2 bilhões. Até agora, saíram do caixa do FNDE R$ 2,6 bilhões. Não bastassem os números superlativos, há 192 obras canceladas depois de terem sido iniciadas, que representam um desperdício de R$ 40 milhões.

Obras paradas

De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), são consideradas obras paradas as paralisadas e as inacabadas. O Simec totaliza 3.417 nessas condições. Uma análise do TCU aponta que o total de obras escolares paralisadas chega a 3.993, considerando, além dessas que atendem a educação básica com dinheiro do FNDE, construções com outros financiamentos e também do ensino superior. Segundo o ministro Santana, porém, algumas já foram concluídas no começo do ano, reduzindo o número para cerca de 3.700 intervenções empacadas.

Especialistas de educação e as próprias vistorias do FNDE apontam que diversos problemas atingem essas obras, causando atrasos ou paralisações. Entre os principais, estão a demora no repasse da verba federal, o abandono dos contratos pelas empresas responsáveis pelo projeto ou até mesmo a mudança do prefeito da cidade ou do governador.

— Obra de escola não deveria ter o financiamento centralizado no governo federal. O MEC deveria aumentar outras verbas para estados e municípios, em merenda e transporte escolar, por exemplo, e liberar estes entes para construir com recursos próprios. O MEC só deveria garantir a assistência técnica — defende Mariza Abreu, especialista em financiamento da educação.

No ano passado, o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro chegou a ser preso acusado de um suposto esquema para liberação de verbas do MEC. Dois pastores, também presos, foram acusados de cobrar propina para conseguir junto ao ministro a liberação do dinheiro do FNDE para obras. Os envolvidos negam os crimes.

Além disso, um levantamento da ONG Transparência Brasil mostrou que a criação do Orçamento Secreto fez com que os critérios de liberação de recursos deixaram de ser técnicos e passaram a ser políticos, o que, na avaliação do relatório, também contribuiu para esse cenário.

Em nota, o FNDE informou que está alinhando com o Ministério da Educação e a Casa Civil na elaboração de uma nova proposta de como fará a liberação de recursos e retomada de obras: “As pastas já demandaram às áreas técnicas estudos para avaliar qual a situação atual e para que sejam tomadas decisões mais acertadas sobre a pauta”.

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