Histórico teatro no Centro do Rio é colocado à venda por R$ 10 milhões
Em 2016, sob a gestão de Eduardo Paes e do secretário de Cultura Marcelo Calero, o teatro foi arrendado para ser incluído na rede municipal de salas de espetáculos. O espaço foi reaberto em grande estilo, com casa lotada e apresentação de Bibi Ferreira, aos 93 anos. A revitalização custou R$ 600 mil, durou seis meses, e reformou palco, camarins, poltronas, banheiros, piso e impermeabilizou a laje. O teatro passou a ter 285 lugares, novos aparelhos de ar condicionado e acessibilidade.
A casa foi encontrada danificada, com queda de pedaços do teto, infiltração e até falta de poltronas e aparelhos de ar condicionado. “Sumiram mais de cem cadeiras, poltronas de 80 anos que foram feitas para o teatro. [Sumiram] bancos da sala de espera, lustres antigos. Sumiu tudo”, afirma Brigitte, que completa:
“Eu estou desde 2019 com o teatro inoperante. As pessoas me procuraram com vários projetos e eu não consegui realizar. Eu vivo disso. O primeiro que aparecer, vou vender. Em 60 anos de trabalho eu nunca na minha vida tive auxílio de dinheiro público. A primeira vez na vida que eu arrendo, destruíram o imóvel, não me pagaram. Deixaram o teatro inoperante”, desabafa a empresária.
A atriz chegou a ter uma reunião em outubro de 2022 com Eduardo Paes sobre o Serrador, mas sem retorno concreto da prefeitura, ela se mostra pessimista quanto a um novo arrendamento. “Se eu não vender, a última resposta é arrendar para igreja. A igreja compra ou arrenda. Mas, gostaria que o teatro continuasse teatro. Você vê a minha resistência: em 60 anos, nunca vendi. Sempre fiz os meus espetáculos. Mas, não tenho mais idade pra isso. Coloquei à venda, e se me aparecer um comprador para o de Copacabana (Brigitte Blair) eu vendo também”, declara a proprietária.
Integrante do corredor cultural da Cinelândia, o Serrador está na mesma região de outros símbolos do Rio, como os teatros Municipal, Rival e Riachuelo (antigo Cine Passeio). Antes de ser municipalizado, em 2016, ele havia ficado fechado por três anos, até ser arrendado pelo poder público.
Uma lei de 1987 restringe a venda de imóveis do Corredor Cultural. O Teatro Serrador é passível de renovação do prédio, mas a medida precisaria passar por análise e aprovação prévia do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade. Além disso, a mudança de uso é proibida. O texto da lei determina a manutenção dos usos, da capacidade e da localização no pavimento térreo das salas de espetáculos dos imóveis que fazem parte do Corredor Cultural. A informação foi confirmada ao O DIA pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, da prefeitura.
Procurada, a Secretaria Municipal de Cultura informou que a retomada do Teatro Serrador está em análise pela prefeitura.
‘Artistas com menos espaços’
Filha da atriz e administradora do Brigitte Blair, Patricia Blair afirma que o arrendamento seria a melhor solução para o teatro. “O que a gente gostaria é que a prefeitura assumisse para que continuasse sendo teatro. Mas como estamos tentando resolver desde 2019, sem solução, esse ano foi colocado à venda”, diz a administradora. “Os artistas vão ficando com cada vez menos espaços para realizarem seus espetáculos. Nunca tem edital para manter teatros. Não adianta fazer vários editais e ir acabando com os espaços”, avalia Patricia.
Quando Brigitte comprou o Serrador, Patricia tinha 6 anos. Ela lembra que foi criada no teatro. “Minha mãe administrava os dois [Serrador e Brigitte Blair]. O Serrador era maior, mais trabalhoso e por isso ela ficava mais lá. Hoje eu sou mais administradora do Brigitte, mas adolescente, era atriz. Fiz vários espetáculos naquele teatro. O Serrador é mágico. Tem uma acústica absurda. As pessoas que subiram naquele palco ficaram encantadas”, relembra.
O Teatro Serrador foi inaugurado em março de 1940 com a comédia “Maria Cachucha”, produzida pela companhia do pai de Bibi Ferreira (1922-2019), Procópio Ferreira (1898-1979). O prédio fica em frente ao Edifício Serrador, futura sede da Câmara Municipal do Rio.
Nos últimos 25 anos, o Rio perdeu palcos importantes, como o Teatro Glória, que ficava no Hotel Glória; o Teatro Delfim, no Humaitá, o Teatro Villa-Lobos, em Copacabana, que pegou fogo; o Maison de France, no Castelo; o Teatro Eva Hertz, na Cinelândia; e, no último mês, a Sala Marília Pêra, do Teatro do Leblon, vendida para a Igreja Lagoinha Zona Sul, comandada no Rio pelo pastor Felippe Valadão.