De Paraty para Chamonix, o professor Adenilson Ribeiro vive a expectativa de mais uma grande lição (de vida)

Professor da rede pública em Paraty, Adenilson Ribeiro terá a missão de representar o povo caiçara na próxima edição da Ultra-Trail du Mont-Blanc (UTMB). Em agosto (26/8), ele trocará a sala de aula da Escola Municipal Maria Jacome de Melo pela trilha dos Alpes Franceses de Chamonix. Desde 2003, a charmosa cidade sedia a mais concorrida e prestigiada corrida de montanha do mundo. Aos 52 anos, Adenilson deu uma importante e prática lição aos pequenos alunos de que não há limite para os sonhos.

– Sou professor e leciono para crianças da faixa etária de 9, 10 anos na comunidade do Corisco. Eu comecei jogando futebol. Em 1995, participei da minha primeira corrida e ganhei, mas fiquei um tempo sem correr e só voltei a participar de corrida em 99 por sugestão do meu antigo treinador de futebol. Desde 99 não parei mais de correr -, recordou Adenilson.

Ele foi um dos seis moradores nascidos no município da Costa Verde do Rio de Janeiro selecionados para integrar o projeto “Um Caiçara em Chamonix”, que conta com o apoio da Secretaria de Estado de Esporte e Lazer do Rio, por meio da Contrapartida Social da Lei de Incentivo ao Esporte, do Governo do Rio de Janeiro.

O quarto lugar geral no Paraty Rail Tour (PRT 20), conquistado em setembro do ano passado, garantiu ao professor um lugar na badalada UTMB. A vaga coroou todo o seu conhecimento, como um genuíno caiçara e professor, sobre a geografia do Parque Nacional da Serra da Bocaina Adenilson na consultoria para a elaboração do circuito nas paradisíacas trilhas locais para a realização do PRT. A história chamou a atenção dos organizadores do UTMB, que não tiveram dúvida em carimbar o convite e o passaporte do ultramaratonista de montanha.

— Quando começou a se falar sobre a UTMB em Paraty, do projeto Caiçara, eu, como corredor amador, pensei nas oportunidades para a comunidade Caiçara e de como me comportaria diante de corredores de todo lugar do mundo: “Como que eu vou correr no meio dessas pessoas? Eu vou estar lá na frente? Eu vou estar no meio?”. Isso cria uma expectativa na gente. Afinal, são profissionais no meio de nós. Como que você vai comportar, como cuidar da parte psicológica e física. No início, bateu uma preocupação – avaliou.

Legado do herói

Em Paraty, Adenilson ganhou status de celebridade local, com direito à homenagem de seus alunos, entrevistas em rádios locais e até a “vaquinha” da comunidade local para contribuir nas despesas do paratiense. Na França, ele será o representante de cerca das 40 comunidades caiçaras existentes na cidade. Uma das lições que o professor poderá ensinar aos competidores estrangeiros é a origem da palavra tupi-guarani. “Caa” significa galhos, paus, mato, e “içara”: armadilha.

Desde 2019, os povos caiçaras são reconhecidos como patrimônio Cultural e Natural Mundial, com um legado de defesa da preservação da natureza e da miscigenação de elementos indígenas e quilombolas ao longo dos séculos na região.

Adenilson foi o caiçara com o melhor desempenho durante o projeto Paraty Brazil by UTMB, um programa destinado a incentivar o esporte na comunidade. Juntamente com outros cinco moradores locais, ele recebeu suporte técnico e material esportivo para se preparar adequadamente para o desafio em Chamonix. Em Paraty, onde a Mata Atlântica proporciona um cenário deslumbrante para corridas e trilhas, ele acabou revelando habilidades excepcionais.

Para Adenilson, a presença na UTMB em Chamonix não se limita a uma conquista esportiva, mas também a um marco pessoal. Afinal, será a primeira vez que deixará a Terra Natal para encarar a primeira viagem de avião, simbolizando o alcance de um sonho que começou nas trilhas de Paraty. Sua jornada é um testemunho do potencial dos caiçaras e da importância de programas como o Paraty Brazil by UTMB, que inspiram jovens e crianças a explorarem o esporte em seu ambiente natural.

Às vésperas da primeira viagem de avião, o professor Adenilson tem realizado uma preparação intensiva para desbravar as trilhas que percorrem cerca de 161 km ao redor do majestoso Mont Blanc, desafiando corredores com suas subidas íngremes e descidas técnicas. O evento atrai não apenas amadores em busca de superação, mas também lendas do trail run como Kilian Jornet e Lizzy Hawker.

De Paraty para Chamonix, o professor Adenilson ensina mais uma importante lição, levando consigo não apenas o apoio de sua comunidade, mas também a esperança de que mais histórias de sucesso possam surgir das trilhas da Mata Atlântica e de como o esporte pode transformar vidas.

– Só conseguia chorar (quando foi anunciado como vencedor do projeto “Um Caiçara em Chamonix”). Até voltar ao normal, a emoção toma conta. A emoção de você olhar para aquela quantidade de pessoas ao meu redor aplaudindo e poder falar da minha história, da minha cidade e o que ela proporcionou. Sozinho você não vai conseguir alcançar o seu objetivo ou aquilo que você sonha. Você depende de pessoas, pessoas que apostam em você, sua família, seus amigos -, disse, emocionado.