ALERJ propões ações para aperfeiçoar o plano decenal de atendimento socioeducativo
A Comissão de Direitos Humanos, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), realizou audiência pública nesta terça-feira (07/10) para discutir a revisão do Plano Decenal de Atendimento Socioeducativo. O documento que orienta as políticas públicas voltadas a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas no Estado do Rio e que completa 10 anos.
Entre as principais medidas propostas pela comissão para aprimorar o documento estão as seguintes:: reestruturação das unidades, com garantia de água potável; aprimorar a central de vagas; adequação ao Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinasi); capacitação dos gestores; valorização de profissionais ,com plano de carreira e de salários; cuidado com a saúde mental e bem-estar dos adolescentes,com protocolos humanizados; garantia de direitos fundamentais, como atividades culturais, acesso a alimentação de qualidade e convivência familiar e comunitária; prevenção à torutra e maus-tratos; e prioridade às medidas em sistema meio aberto.
“Nos últimos anos, o plano vem sendo constantemente debatido. É preciso pensar nos direitos dos adolescentes e o caráter de ressocialização tão inerente ao sistema do Departamento Geral de Ações Socioeducativas, o Degase. A comissão vem visitando algumas unidades do Degase, como o de Campos, que desafia a lógica da regulação de vagas e a acessibilidade, pois fica a caminho de São Fidélis, no meio de uma estrada. Passamos por temas delicados, como as condições de trabalho dos agentes e a rotina dos jovens nas unidades. Foram as ausências de políticas públicas que colocaram os adolescentes nestes lugares. Precisamos recuperar no socioeducativo uma perspectiva de futuro”, disse a deputada Dani Monteiro (Psol), presidente da Comissão.
A representante do Centro de Defesa dos Direitos Humanos e da Criança e do Adolescente (Cededica), Clara Lucchese, sublinhou as dificuldades do Degase da cidade de Campos. “A unidade de Campos nos traz questões muito importantes. A distância não é só física, mas uma invisibilidade no mapa. Para acessos a serviços básicos é muito difícil”, relatou.
Ao falar em nome do Degase, Thereza Nunes falou sobre os desafios de implantar unidades do órgão no estado. “O Degase tem dificuldade de achar locais para instalar unidades, porque somos rejeitados pela sociedade. Acredito que à medida que as pessoas tenham conhecimento sobre essa temática, vamos conseguir avançar mais na construção do plano socioeducativo”, comentou.
A coordenadora da educação de jovens e adultos da Secretaria Estadual de Educação, Heloisa Andrade, citou o processo educativo como ponto fundamental para a ressocialização dos adolescentes. “A educação faz diferença na vida destes jovens. Quero que o menino da socioeducativa vá para o mercado de trabalho e tenha a vida transformada pela educação”, pontuou.
Representante do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (MEPCT/RJ), Anne Claudia Félix elencou o que o órgão observa como pontos importantes a serem melhoras e modificados.“Através das nossas inspeções, sinalizamos os seguintes pontos: medidas alternativas, sendo a privação de liberdade uma situação excepcional; agravamento da saúde mental dos internos, sobretudo nas instituições no interior e a longa permanência nos alojamentos, sendo válido resgatar a convivência coletiva. A unidade de Campos é a nossa maior preocupação, por isso aumentamos as inspeções nessa unidade. Consideramos essencial que cada vez mais as pessoas entendam como estão as unidades socioeducativas para compreender o território em que vivemos”, disse.
A integrante do Conselho Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedca), Monica Alckimin, falou que é preciso olhar para os outros critérios de punição ao jovem infrator. “Uma política deliberada dentro de uma democracia tem vários olhares, como o do estado e também da sociedade civil organizada. Precisamos falar da importância de todas as medidas aplicadas aos adolescentes infratores, porque a privação de liberdade é apenas um dos pontos. É preciso falar também da integração do orçamento e destinação destes recursos”, ponderou.
Já a representante do Movimento Moleque, Mônica Cunha, destacou a ausência de recursos para políticas voltadas aos jovens que estão em medidas socioeducativas. “Adolescentes morrerem dentro das unidades é absurdo. O orçamento destinado às medidas socioeducativas ainda não é prioridade”, observou.
“Os jovens que estão no processo socioeducativo têm direitos. Mesmo que nos canse, enquanto minoria, há batalhas que vencemos, como a não redução da maioridade penal. É preciso ter instrumentos legislativos e regulatórios que ponham limite ao Estado, e o Plano Decenal Socioeducativo é um desses instrumentos”, disse o deputado federal Tarcísio Motta (Psol).
Arte como ferramenta de ressocialização
Integrante do Núcleo de Tutela Coletiva do Ministério Público, Janaína Pagan lembrou o que ainda precisa ser melhorado em unidades do Degase e sobre as oficinas de manifestações artísticas. “Quanto à internação, trouxe algumas questões. Primeiro, a reestruturação das unidades socioeducativas. Ainda observamos que elas ainda não têm o número de vagas necessárias A unidade Dom Bosco conta com uma ala que precisa ser fechada, por recomendação da ONU, há quase dez anos. Em 2025, ainda temos essa ala do antigo Padre Severino aberta e que há casos de violência, principalmente à noite. Observamos com preocupação como é destinado o orçamento para o Degase, pois, entre outras questões, o órgão optou em tirar os técnicos de enfermagem da noite. Tivemos uma situação de um adolescente que faleceu à noite, no Dom Bosco, e não havia nenhum técnico de enfermagem no local. É preciso falar também sobre a importância da cultura dentro dos espaços socioeducativos, como oficinas de hip hop e grafite. E encerro falando a respeito do pós medida socioeducativa, para acompanhar de maneira ampla o adolescente”, pontuou.
O coordenador da Roda Cultural da Cidade de Deus ,Tiago Lima, também citou as ações culturais como ponto chave para os jovens que cometeram algum ato infracional. “Realizamos algumas dinâmicas nas unidades, como a oficina de hip hop. A cultura é fundamental dentro destes espaços, pois os jovens se identificam com aquilo que está mais próximo da realidade deles. Esse trabalho transforma a vida de muitos deles”, finalizou.
Estiveram presentes ainda na audiência pública a defensora pública estadual Carolina Henning, a representante do Instituto de Estudos da Religião (Iser), Késsia Gomes, além de outros órgãos e a sociedade civil.