Os cariocas que receberam o mais alto título do Benim através da dança
Há 12 anos em cartaz no Rio de Janeiro, o musical “Ginga Tropical” mostra um pouco do que é ser brasileiro — e sobretudo carioca — sob um olhar negro e sem estereótipos.
No dia 12 de novembro, no meio da plateia do Teatro Fashion Mall, um espectador saiu tão maravilhado que correu para casa e recomendou o espetáculo para todo mundo.
A residência desse mais novo fã ficava a quase 6 mil quilômetros do Rio. E os elogios ao espetáculo foram para o governo de um país.
Essa é a história de como 14 dançarinos do “Ginga” se tornaram cidadãos beninenses, a mais alta comenda daquela nação africana.
Com litoral no Oceano Atlântico e pouco mais de 13 milhões de habitantes, o Benin passou a conceder sua nacionalidade a todos os afrodescendentes do planeta. Entre os séculos 16 e 19, 2 milhões de beninenses foram retirados à força de sua terra para que servissem, escravizados, no Brasil.
Todos os anos, o Benim organiza o Vodun Festival, uma grande homenagem às divindades do Vodu, religião que adora espíritos naturais e reverencia os ancestrais, com origem no reino de Daomé — atual Benim e Togo.
De volta a novembro: o tal espectador era um alto executivo do maior banco de investimento do Benim, e logo suas impressões sobre o “Ginga” chegaram ao presidente do país.
Na sequência, os dançarinos foram convidados para se apresentar no Vodun Festival, no início deste mês. E então se tornaram cidadãos beninenses.
De comissária a idealizadora
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O “Ginga Tropical” é dirigido e produzido por Rose Oliveira, uma das primeiras negras do Brasil a servir como comissária de bordo.
“No início eu tinha dificuldade de entender que negro e negra não poderiam estar onde devemos estar. Mas, ao longo do tempo, eu vi que era necessário estarmos ali”, declarou Rose.
“Quando eu trabalhava na classe executiva [dos aviões], as pessoas achavam que eu estava ali para sexo ou algo do tipo. Mas resisti. Algumas pessoas acham que no Brasil as mulheres são sexualizadas”, lembrou.
Com a falência da Varig, Rose decidiu abrir a companhia para mostrar o que o Brasil tem de melhor — “e tirar o estereótipo sexual”.
Segundo Rose, e reconhecimento pelo governo do Benim é importantíssimo para o povo negro e para o Rio.
“Eu levei 13 pretos, desde quem nasceu em 2003 até quem nasceu em 1970. Tinham analfabetos, semianalfabeto e letrados. Eu agradeci aos deuses por ter esse privilégio”, contou.
Os dançarinos destacaram a emoção e a importância de representar o país no evento.
“Ir para o Benim teve um sentido totalmente especial, principalmente para mim, que considero a viagem um presente ancestral”, disse Luana Bandeira.
“Esta conexão com o Benin e com as tradições voduns começaram com o enredo que deu o campeonato para a Viradouro [em 2024]”, diz Luana, destaque da Vermelha e Branca.
Paolla Nascimento, musa da Porto da Pedra, acredita que a apresentação do espetáculo foi uma maneira de reconexão com a ancestralidade.
“Foi uma oportunidade muito valiosa. O Benim, nosso berço ancestral, tem uma cultura valiosa, porque a África é tão diversa. É muito importante fazer parte do elenco formado por pessoas que respiram a cultura brasileira, com um show que resiste há mais de uma década, que representa a nossa cultura, a nossa diversidade”, comentou Paolla.
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