Lula critica possibilidade de intervenção estrangeira em países da América Latina
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou a possibilidade de intervenção estrangeira na América Latina e no Caribe, sem fazer menção direta a ações e intenções do presidente estadunidense Donald Trump em relação a Venezuela e Colômbia.
Na América Latina e Caribe, também vivemos um momento de crescente polarização e instabilidade. Manter a região como zona de paz é nossa prioridade. Somos um continente livre de armas de destruição em massa, sem conflitos étnicos ou religiosos. Intervenções estrangeiras podem causar danos maiores do que o que se pretendia evitar”, afirmou Lula
A fala fez parte do discurso proferido durante cerimônia de entrega de credenciais a novos embaixadores e embaixadoras estrangeiros no Brasil. A entrega foi realizada no Palácio do Itamaraty, no final da manhã desta segunda-feira (20/10), em Brasília.
O governo dos Estados Unidos posicionou tropas militares em águas próximas à Venezuela e têm abatido barcos venezuelanos, sob alegação de que as embarcações transportariam drogas, e que o presidente Nicolás Maduro seria chefe de um cartel de tráfico de entorpecentes. Alegação semelhante fez Trump contra o presidente da Colômbia, Gustavo Petros.
Lula também reiterou as expectativas positivas do Governo do Brasil quanto à realização da COP 30 em Belém, no próximo mês. O presidente brasileiro disse também que um dos objetivos de seu mandato é fortalecer o multilateralismo, que, por sua vez, baseia-se em relações “cordiais”.
Leia o discurso de Lula:
“Quero iniciar essa cerimônia de apresentação de credenciais apresentando minhas mais sinceras desculpas a todos e a todas embaixadores e embaixadoras que nos honram com sua presença em nosso país.
Gostaria de dedicar a cada um de vocês o tempo que merecem para tratarmos das relações bilaterais entre nossos países.
Razões de agenda impõem uma cerimônia mais curta, mas não menos importante.
É motivo de orgulho para o Brasil acolher um dos corpos diplomáticos mais numerosos e diversos do mundo.
Poucas capitais têm tantas embaixadas estrangeiras acreditadas como Brasília.
Levar o Brasil de volta à cena internacional foi uma das primeiras e mais urgentes missões do início do meu terceiro mandato.
Viajei para 37 países, nos cinco continentes, neste meu terceiro mandato.
Este ano voltarei à Ásia pela terceira vez. No primeiro semestre, estive no Japão, no Vietnã e na China.
Amanhã eu inicio uma viagem para o Sudeste Asiático, onde realizarei visitas de Estado à Indonésia e à Malásia, cujo novo embaixador apresenta credenciais hoje.
Também participarei da Cúpula da ASEAN, em Kuala Lumpur.
A Ásia como um todo vem-se consolidando como eixo dinâmico da economia global.
Com vários países dessa região, já temos volume de comércio superior ao que possuímos com vários sócios tradicionais.
Entre 2023 e 2025, o Brasil abriu seus braços para o mundo e para a defesa do multilateralismo.
Sediamos as Cúpulas do G20 e do BRICS, no Rio de Janeiro.
Acabo de voltar da sede da FAO, em Roma, onde participei dos 80 anos da Organização e inaugurei o Mecanismo de Apoio da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, criada na nossa presidência do G20.
Um dos pontos altos deste meu terceiro mandato foi ter participado na 37ª Cúpula da União Africana como convidado especial em fevereiro de 2024.
Em maio passado, organizamos, em Brasília, o Segundo Diálogo Brasil-África sobre Segurança Alimentar.
Temos com a África uma dívida que só pode ser paga em solidariedade, cooperação e transferência de tecnologia.
Tenho grandes expectativas com a próxima Cúpula do G20 em Joanesburgo.
Em menos de 20 dias, receberemos a COP-30, que será decisiva para o futuro da humanidade.
O ano de 2024 foi o mais quente da história.
As florestas tropicais estão sendo empurradas para seu ponto de não retorno.
A Conferência de Nice, em junho, deixou claro que os oceanos estão febris.
A COP30, em Belém, será a COP da verdade.
Será o momento de os líderes mundiais provarem a seriedade de seu compromisso com o planeta.
Muitos países ainda precisam apresentar suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (as NDCs).
O Brasil se comprometeu a reduzir entre 59 e 67% suas emissões, abrangendo todos os gases de efeito estufa e todos os setores da economia.
A noção de justiça climática também será crucial. Isso implica em apostar em ações comprometidas com o combate à fome e às desigualdades socioambientais.
Nações em desenvolvimento enfrentam a mudança do clima ao mesmo tempo em que lutam contra outros desafios.
É preciso um compromisso real de financiamento por parte dos países que mais poluíram ao longo dos últimos duzentos anos.
Faz parte desse desafio viabilizar os meios de implementação necessários, hoje estimados em 1.3 trilhão de dólares, partindo dos 300 bilhões já acordados na COP29 no Azerbaijão.
Fomentar o desenvolvimento sustentável é o objetivo do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que o Brasil pretende lançar para remunerar os países que mantêm suas florestas em pé.
Para as relações exteriores do Brasil, o ano ainda contará com mais um evento de destaque, a Cúpula do MERCOSUL, em dezembro.
Nessa ocasião, pretendo cumprir mais uma promessa, que é a assinatura do Acordo MERCOSUL-União Europeia, que já espera por mais de 20 anos.
As relações com a Europa seguem estratégicas. O Acordo é um símbolo contra o recrudescimento do protecionismo.
Estamos criando uma das maiores áreas de livre comércio do mundo, reunindo mais de 700 milhões de pessoas e um PIB de mais de 22 trilhões de dólares.
Na América Latina e Caribe, também vivemos um momento de crescente polarização e instabilidade.
Manter a região como zona de paz é nossa prioridade.
Somos um continente livre de armas de destruição em massa, sem conflitos étnicos ou religiosos.
Intervenções estrangeiras podem causar danos maiores do que o que se pretendia evitar.
Por isso, meus amigos e minhas amigas, eu quero desejar a vocês toda sorte do mundo aqui no Brasil.
Vocês serão tratados e terão atenção do Itamaraty, como se fossem amigos nossos há muitos anos, porque o que nós queremos é mostrar ao mundo que nós precisamos fortalecer o multilateralismo.
E o multilateralismo é baseado na boa relação cordial, comercial, econômica e, sobretudo, uma relação pacífica — sem ódio, sem negacionismo e sem ferir o princípio básico da democracia e dos direitos humanos.
Sejam bem-vindos ao Brasil e muito obrigado pela presença de vocês aqui.
Um abraço e boa sorte.”