Estudar para recomeçar: parceria entre Cedae e Rural leva educação a pessoas em cumprimento de pena
Depois de quase 30 anos longe da escola, Marcelo voltou a ocupar uma sala de aula. Aos 45 anos, ele participa do “Educação pela Liberdade”, disciplina de extensão criada pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) em parceria com a Cedae, que abre novas portas para quem busca retomar os estudos.
Marcelo é integrante do Replantando Vida, programa socioambiental da Cedae que alia a recuperação de áreas degradadas à ressocialização de pessoas em cumprimento de pena, oferecendo trabalho, capacitação e novas perspectivas.
– Eu estudei até a sexta série e depois fui direto para a construção civil. Sempre precisei muito da matemática e do português. E da prisão eu vim para o Replantando Vida, onde estou atuando há 1 ano e 4 meses, trabalhando todos os dias e pronto para voltar ao mercado de trabalho. Esse auxílio chegou na hora certa – conta.
Desde julho, a iniciativa oferece aulas de português e matemática para 30 alunos, entre apenados e estudantes da Rural. O curso é realizado todas as segundas-feiras, das 14h às 16h, no Centro de Ressocialização Chagas Freitas, localizado na Estação de Tratamento de Água (ETA) Guandu, em Nova Iguaçu.
Segundo Alan Abreu, gerente de Restauração Florestal da Cedae, o objetivo do projeto é ir além do trabalho, criando oportunidades de desenvolvimento pessoal e social.
– Nosso foco é buscar parceiros que possibilitem não apenas capacitações técnicas e profissionais, mas também a elevação da escolaridade. Por isso, nos unimos à UFRRJ para atender a essa demanda. Com o curso, cada aluno da Rural se torna tutor de um apenado, garantindo acompanhamento individual – explica.
A metodologia é inspirada no pensamento freireano, que valoriza a experiência de vida do aluno e entende o aprendizado como resultado do diálogo e da troca. A ideia é que o conhecimento seja construído a partir da realidade concreta de cada participante. Dessa forma, temas cotidianos – como trabalho, tecnologia e convivência social – se transformam em conteúdos de aprendizagem.
Além das aulas de português, produção de texto e matemática aplicada, há debates, rodas de conversa e atividades ajustadas aos diferentes níveis de escolaridade. Para a professora Adriana Costa, a iniciativa também enriquece os docentes.
– Nós, professores da Rural, junto com os alunos, os licenciandos, temos aprendido muito nesse espaço, na relação com os alunos aqui da Cedae. Eles nos ensinam a ser melhores professores. E eu diria mais: a ser melhores seres humanos também, porque aprendemos a dialogar mais e a ajustar nossas aulas às necessidades reais deles – afirma Adriana, que participa do projeto em atividades de alfabetização.
Mais do que somar conhecimento, o projeto resgata a autoestima e prepara para o futuro. Marcelo resume o impacto: o estudo devolve não apenas a chance de voltar ao mercado de trabalho, mas também a de reconstruir laços.
– Estudar é maravilhoso, é aprender a falar o nosso idioma, a fazer nossas contas, a dividir conhecimento com quem ainda não sabe. Eu aconselho os colegas que venham também: trabalhem, lutem, estudem, que é o futuro – ressalta.
O curso segue até dezembro, acompanhando o calendário acadêmico da universidade, e novas turmas já estão previstas para o próximo semestre. A proposta é permitir que os atuais alunos avancem e que novos participantes ingressem.