‘Opositores precisam aceitar legitimidade do Estado democrático’, diz Benjamin Teitelbaum, em entrevista
A comunidade internacional está em estado de alerta em relação ao Brasil e ao futuro do governo Lula. A preocupação é, sobretudo, acerca da relação entre o presidente e as Forças Armadas e policiais, apontou Benjamin Teitelbaum. Ele é autor de “Guerra pela eternidade: o retorno do tradicionalismo e a ascensão da direita populista” e professor de Assuntos Internacionais e Etnomusicologia da Universidade do Colorado. Seu livro é baseado em pesquisa e entrevistas com ideólogos conservadores como o americano Steve Bannon, ex-assessor de Donald Trump.
Depois dos episódios de 8 de janeiro, o que mais se pode esperar do bolsonarismo e como lidar com esse movimento?
É uma pergunta difícil. Uma das coisas que não recomendaria é tentar banir o bolsonarismo, porque isso seria antidemocrático. A resposta deve ser firme, mas democrática.
Os que cometem atos de vandalismos devem ser punidos?
Sim, claro. Os atos de vandalismo devem ser punidos, as pessoas que os cometam devem ser processadas. Isso não é antidemocrático. Mas, ao mesmo tempo, (o presidente) Lula deve promover reformas nas instituições. Uma das diferenças entre o 6 de janeiro nos Estados Unidos e o 8 de janeiro é que no Brasil vemos que existem simpatias entre militares e policiais com o movimento (bolsonarista). Temos muitos militares envolvidos em política e isso é complexo. Isso pode virar algo sério. Observadores internacionais estão preocupados.
Que reformas o presidente Lula deve fazer?
O que teria acontecido se os militares tivessem se mobilizado contra a democracia, e não apenas dado espaço aos manifestantes (em frente aos quartéis)? Isso é o que muitos temem. Lula deve reformar as instituições militares e policiais, e não será fácil. Deve despolitizar essas forças.
O senhor teme novos episódios de violência no curto prazo?
Não prevejo outro episódio similar no curto prazo. As condenações que vimos foram contundentes. O bolsonarismo deverá viver sua vida, talvez tenha uma morte natural. Não vejo que este nível de estresse social possa ser mantido. A atenção hoje é extrema, e existe consenso político. Foi tudo muito terrível, a destruição, e nada foi validado politicamente.
Quais são os riscos que o Brasil enfrenta hoje?
Gostaria de ter respostas mais claras, mas não tenho. Acho que é importante que o governo implemente políticas saudáveis, alcance consensos, avance com reformas. Lula formou uma coalizão com setores de centro-esquerda e centro-direita e venceu a eleição. Agora deve reformar instituições.
Qual é a importância de Bolsonaro como líder para o bolsonarismo?
Bolsonaro é bastante incompetente, não é um bom político. Acho que o bolsonarismo poderia ser forte se conseguisse propor alternativas e soluções ao país, se gerasse sentimentos com que as pessoas se identifiquem. O populismo sempre poderá fazer alguma coisa em situações nas quais as pessoas não se sintam identificadas com os partidos mais tradicionais e os que estão no poder.
É crucial a relação de Lula com as Forças Armadas?
Sim, esse é um grande desafio. Lula tem tempo e espero que avance com seu projeto, que deve ser sobre a democracia brasileira.
Qual é a dimensão do bolsonarismo radical?
É uma minoria, mas de certo tamanho. Mas numa democracia, minorias são um problema de todos. Para que um Estado democrático seja legítimo, até mesmo os opositores do governo devem aceitar essa legitimidade. Devem aceitar que são parte de uma comunidade, na qual se ganha e se perde. Se 20% rejeitam o sistema, essas pessoas não podem ser ignoradas.
Como o senhor analisa o futuro de Bolsonaro?
Se ele violou a lei, deveria ser preso. Mas isso deve ser claro e contundente. Se ele for tratado de uma forma injusta, isso terá impacto.